domingo, janeiro 27, 2008

Dois poemas de Israel Belo de Azevedo


O ÚNICO
"Tu es digno de receber a gloria, a honra e o poder, porque todas as coisas por tua vontade vieram a existir e foram criadas" (Apocalipse 4.11)

Os outros eram como todos somos
e se tornaram o que não somos.
O Único era diferente de nós
e se tornou o que somos.
Quando nasceu, na linha máxima da pobreza,
foi celebrado por vozes aos ouvidos estranhas
e saudado por gente que se despreza
e recebido por uma mãe toda surpresa
e perfurmado por reis de história rasa.

Os outros deixaram frases de revolução
que trouxeram esperança de guerra ou paz.
O Único viveu palavras de plena verdade,
poesia vivida e roteiro claro para a eternidade.
Quando falou, a muitos pareceu em vão,
porque seus ouvintes preferiam sinais
que o tempo com o tempo desfaz.

Os outros buscaram corajosamente a santidade
e acertaram e erraram no trajeto.
O Único não trilhou um sequer desvio,
não porque já soubesse o caminho,
mas porque era o próprio Itinerário.
Quando viveu, não teve um travesseiro
mas serviu de ombro ao companheiro
que com um beijo renunciaria ao projeto.

Os outros chegaram ao fim como pó,
que é o destino de todo humano.
O Único ia tendo o mesmo destino,
mas dias depois de ter na cruz pendido
ainda partilhou um peixe com os amigos
antes de regressar para Onde veio.
Quando morreu, como parte do seu mistério
a história se rasgou bem no meio
como um relâmpago que o céu divide
como se uma saída para o retorno abrisse.

Os outros deixaram de viver conosco,
mas o Único me escolta todo dia
no percurso do deserto ao oásis desejado,
digno, pelo que fará e agora faz,
de escutar de mim a melodia
da honra e do louvor e da glória, que me traz
à memória o que sou: amado.


ORAÇÃO DE JONAS

Na minha aflição, junto ao abismo da morte,
levado para o fundo na onda do pavor
que escrevia sozinha minha triste sorte,
longe da face afável do meu Redentor;

minha dor crescendo sem que ninguém se importe,
meu futuro encerrado num muro de horror,
meu sonho pintado em imagens de terror,
minha fé cessando qual vela sem suporte,

das promessas do Pai a mim não esqueci.
a Ele por socorro em lágrimas clamei,
de olhos fechados Seu rosto contemplei

por fé um cântico grato eu lhe ofereci
por um instante, apesar da dor, não temi,
e o Espírito agiu e sua voz escutei.

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