Aborto do Aborto
O único aborto permitido
Deveria ser o aborto do
aborto
A dor do parto
É menor do que a dor da
morte
O parto convida à luz
O aborto conduz às trevas
O parto é uma dádiva
divina
O aborto, um castigo
demoníaco
O parto traz choro de
alegria
O aborto derrama lágrimas
de miséria
O parto constrói um doce
lar
O aborto cava uma amarga
sepultura
O parto é um caminho que
leva à casa
O aborto é a trilha que
empurra para o féretro
O parto produz comunidade
O aborto confina ao
isolamemto
Parto e aborto
Derramam sangue humano em
seus atos
Mas o parto é sentença de
vida
O aborto é sentença de
morte
A palavra de ordem é
abortar o aborto
Ele elimina a vida desde
os seus primórdios
Navegar é preciso
Viver também é preciso
Pois o aborto é a grande
tragédia da curta vida
De um indefeso feto
Que um dia foi desafeto de
alguém
Mesmo antes de ter tido a
oportunidade
De se defender do erro ou
do acerto
Que de fato, sendo feto
Nunca chegou a cometer
Alicerce de Vida
Você pode habilmente
enganar-me
Mas não pode tirar-me a
verdade
Ela não depende das
desinformações
Imputadas por polifonias
em meu dia-a-dia
Você pode armar-me ciladas
Mas não pode reter-me em
armadilhas
Elas tornam-se frágeis
tecidos de seda
Apenas para ornar a minha
liberdade
Você pode alienar-me de
todas as minhas posses
Mas não pode atirar-me no
lixo podre da sociedade
A minha dignidade vem do ser
que me criou
E não dos bens que tenho
ou não tenho
Você pode destruir os meus
argumentos
Mas não pode anular a
minha fé
Ela é “certeza de coisas
que se esperam
E a convicção de fatos que
se não veem”
Você pode executar o meu
corpo físico
Mas não pode aniquilar a
minha alma
Mesmo o corpo morto
ressuscita
Em um viver para sempre na
imensidão da eternidade
Você pode ser um rei todo
poderoso
Porém jamais será minha
majestade
Sou da pasárgada mais sui generis que existe
Onde os súditos são
servidos pelo seu supremo líder
Você pode possuir um poder
inquestionável
Mas não vai me condenar à
servidão voluntária
Embora ainda passível a
confinamentos
Sou liberto para servir
com prazer a alguém que é eterno
Aliança Correta
Certos tipos de pensamento,
com seus tentáculos
Agarram braços, pernas,
pescoço
Intestinos, coração e
emoção – o corpo todo
Derrubam no chão os mais
bravos lutadores
Que, imobilizados, perdem
todo e qualquer combate
Os mais fracos desses
pensamentos
São mais aguerridos do que
o mais forte dos adversários
Têm a potência de um
maremoto
Que com imedida
brutalidade
Abala todo sangue no
interior da malha de veias e artérias
Nessas aguerridas
ofensivas
Barricadas, barreiras,
trincheiras
Verdadeiras fortalezas são
em vão erguidas
Qualquer vitória se
inscreve inacessível às indefesas vítimas
A menos que vigorosa
aliança seja celebrada
Com um supremo ser sagrado
Onisciente
Onipresente
E onipotente
Cujo monossilábico nome é
Deus
Isaac Souza é missionário da Agência Presbiteriana de Missões Transculturais. Formado em Letras e com mestrado em Linguística, Isaac é autor do livro De Todas as Tribos, pela Ultimato, em 1996 (segunda edição: 2003). Organizou ainda, com Ronaldo Lidório, o livro Questão Indígena - Uma Luta Desigual, pela Ultimato, em 2008.
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