quinta-feira, março 18, 2021

Três poemas de Sandro Pinto

 


{O fim do cruzeiro do sul}

O azul será
Maciço
O riso
Objeto eterno e
Sua imagem reversa
Reflexo nos olhos
Polidos
Daqueles que em parte são o que foram e
Jamais serão o que haviam
Sido
Estaremos em paz
Livres de desejar
O bem quisto
E do desejo
De ser livre
E do desejo
De apetecer
(Sem o pesar previsto
No morrer
Pra ser vivo)
Não seremos mais
Fragmentos nem
Firmamento
O todo será
Sentido:
Pétalas em aderência eterna
À haste verde do que nunca deveria ter
Ido
As memórias serão todas
Piso do passado
Flácido
A partir do qual velejamos sem porto
À parte daquilo que as bocas tortas
Famintas
Julgavam infinitas
Mostras
Não haverá mais grade
Dos alvos sem mira
Nem tardes gris
Nossas omoplatas serão amplas e
Anis
Seremos mar azul
E veleiro sem sul
Afinal
A graça do cruzeiro será sem
Norte.


{Fugaz}

São olhos de mar
Líquidos
No molde daquilo que me encerra
Em números ordinais
É boca de terra
Enviesada banguela
À prova de sonhos
Ao gosto ordinário
É praça modesta
Com o monumento semântico
Paro
Contemplo estanco
De quem se trata?
De quando data?
Como é que eu era?
Meço profundeza d’águas
Me vejo raso
Sobre exata camada entre meios
É minha imagem ondulante
E meu sorriso escarpado
Campo de centeio
São esses mares de morros
Onde uma criança
Corre sem rumo.


{A mão}

Ouça a canção que lhe dá sentido
E procure a mão que lhe complementa.
Àqueles que dançam contigo,
Sorria,
E gentilmente
Cumprimente.
Afinal
Cada instante é funil;
Cada ponteiro é vespeiro.
E meus avós já morreram há eras
Renascendo a cada fio branco
Que me desponta.
Assim
Quando os dias excederem as contas
Conforme a ascensão das heras,
Nem às sombras seremos afins,
Somente aquilo que as sustenta.
Ouça a canção que lhe dá sentido
E procure com todo afinco
A mão que lhe complementa.

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