O Sinal do
Amor
Alfredo Mignac
Ruge, rasga e
rebenta as mais fortes muralhas,
as trincheiras
de ferro e de arames em malhas
o Tanque de
aço puro, em metralhar constante!
Ribombam mil
canhões no espaço ígneo, inflamante,
avançando, na
fúria imensa de matar...
Aviões e
zepelins zunindo pairam no ar,
despejam morte
e horror por sobre a terra em brasa,
onde tudo se
agita e se estorce e se arrasa!
Nuvens
plúmbeas lá vêm, roladas pelo vento,
trazem gases
no bojo e matam num momento!
As máquinas de
guerra assumem proporções
de mastodontes
cruéis avançando aos bilhões!
No mar, por
cima, estão esquadras fumegando,
a toda força,
em marcha, os torpedos lançando!
Por baixo, mui
sutis, farejam submarinos,
como fazem com
a presa os astutos felinos!
As minas,
quantas são! Bem profundas, parecem
uns peixes
verticais que nunca se movessem.
Trazem, no
corpo escuro, o obuz-metralhador,
que, ao mais
leve contato, explode aterrador!
No campo de
batalha, ao raso ou na montanha,
a guerra, num
sorriso, os dentes arreganha!
A sua
gargalhada apavorante e hedionda,
ora o som tem
da trompa adâmica que estronda,
conclamando da
raça os batalhões sem fé,
que há seis
mil anos traz o anátema de ré;
ora o som tem
rouquenho e estranho dos rugidos
dos doidos nas
galés, dos raivosos e feridos,
das masmorras
fatais e horríficas do inferno!
Lembrais-vos?
foi na guerra – o pandemônio eterno –
aquela guerra
atroz, ingente, fratricida,
que o universo
abalou, levando-o de vencida,
de novecentos
e quatorze até dezoito, -
- fantasma a
perpassar num rubro gesto afoito -;
lembrai-vos?
foi ali, na hecatombe tremenda,
que a Justiça
perdeu dos olhos seus a venda
e a Paz
sublime e o Amor fugiram para o Ignoto,
que o sangue
espadanou de cada peito roto,
em pútrida
caudal umedecendo o chão!
Lembrai-vos?
foi ali, nação contra nação,
homem contra
homem, reis e príncipes e quantas
democracias
houve. Eram tantas e tantas,
que em breve o
mundo inteiro entrava na babel
de confusão e
horror, de ódio, ruína e fel!
Lembrai-vos?
foi ali que os pais perdendo a vida,
deixaram na
orfandade a prole tão querida!
E, mais tarde,
na campa erma do cemitério,
um corpo jaz
no pó sangrento e deletério...
... ... ...
... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ...
Em plena
guerra! A Norte-América enviava
para o front
europeu as forças que alistava.
Cada jovem
robusto era da pátria amada
ousado
defensor, sentinela avançada!
As mães viam
partir os filhos para a Luta,
cheias de
gratidão e de fé impoluta,
dando-lhes,
com um adeus, as bênçãos maternais,
antevendo o
Perigo e orando pela Paz!
Cada lágrima
então, que lhes molhava o lenço,
interpretava a
dor do seu sofrer imenso!
Numa tarde
sublime, às horas do arrebol,
quando se
transmontava e se sumia o sol,
aquela mãe
querida à mão trazendo a filha,
a mais
pequena, em cujo rosto a graça brilha,
vai ao jardim
fronteiro espairecer um pouco,
esquecer o seu
gesto amavelmente louco.
- Mamãe, por
que é que em toda casa, na janela,
eu vejo, na
vidraça uma bonita estrela?
- Ah!
filhinha... a razão da estrela que tu vês,
(olha ali uma
casa onde se avistam três!)
... a razão,
meu amor, - sentemos no gramado –
é que dali
saiu, para a guerra, um soldado!
Talvez mais de
um: dois, três, lá se foram, cantando,
enquanto no
seu lar os pais ficam chorando...
E a criança
elevando o olhar para o infinito,
vermelho,
branco e azul – mosaico de granito,
formando o supedâneo
aos páramos celestes –
vê,
fulgurando, envolta em reluzentes vestes,
linda, a
Estrela da Noite...
Oh! mamãe... e
por que
na janela do
céu uma estrela se vê?
No regaço
tomando a filhinha inocente,
que apontava
com o dedo a estrela refulgente,
a doce mãe
explica:
- Ah! querida,
faz anos
que, por causa
de nós, pecadores humanos,
uma guerra
medonha aqui se declarara.
Satanás,
investindo, a todos derrubara,
trazendo, então,
o mundo a seu poder sujeito!
Porém o nosso
Pai – o Amor-Todo-Perfeito
enviou seu
Filho ao mundo, à guerra mais fatal
de quantas já
forjou o gênio vil do mal!
E um dia,
sobre a cruz, sereno, extraordinário,
o General
venceu na luta do Calvário!
Depois
ressuscitou, abatendo o inimigo,
- Paladino do
Bem, dando à nossa alma Abrigo!
E, desde
aquele dia em que o Pai no-lo enviou,
à janela do
céu uma Estrela engastou!
Esta, que
lembra o Amor que nos legou a Paz,
e que no azul
profundo, à noite, brilha mais...
in O Jornal
Batista #50 – Dez 1935
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