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sábado, outubro 06, 2018
Como Queres?, poema de Gióia Júnior
COMO QUERES?
Inspirado em uma inscrição dos primeiros séculos da era cristã.
Sou o caminho e não segues,
sou a luz e tu não vês,
sou a água e tu não bebes
sou a verdade e não crês.
Sou o pão e tu não comes
o tronco e não és o galho,
não aceitas o meu nome
nem vives em meu trabalho.
Sou a paz - queres a guerra
contra mim sempre te elevas -
sou a luz que veio ao mundo
mas queres viver em trevas.
Como queres que eu te queira
te alimente Se não tens fome,
te salve se não me aceitas,
Teu Pai - não sabes meu nome?
Como queres que eu te cure
do crime da ingratidão
se blasfemas contra mim
e zombas do meu perdão?
Por isso vives sozinho
sem horizonte e sem luz.
Queres paz? - SOU O CAMINHO -
Queres vida? - ACEITA A CRUZ!
Do livro 25 Anos de Gióia Júnior
segunda-feira, junho 11, 2012
A Oração da Maçaneta, de Gióia Júnior, recitada pelo próprio poeta
Ouça no vídeo abaixo o famoso poema 'A Oração da Maçaneta', do poeta evangélico Gióia Júnior, declamada pelo próprio.
quinta-feira, dezembro 01, 2011
GRANDE CANTATA DE NATAL, poema de Gióia Júnior
GRANDE CANTATA DE NATAL
Cantarei o Natal,
mas o Natal-acontecimento,
o Natal exato,
realidade confortadora e simples,
o Natal sem sonhos.
Não o Natal de Papai Noel,
de São Nicolau,
do trenó sobre a neve,
do buraco da fechadura,
da chaminé delgada e escura,
do farnel de brinquedos...
Não!
Esse, positivamente, não é o Natal,
esse é um Natal de mentira,
inventado por alguém sem imaginação.
Não e Não!
Postiço e falso é o natal dos brinquedos:
da árvore de bolas amarelas, verdes,
vermelhas, azuis, prateadas, douradas,
espelhando rostos alegres,
alongando e diminuindo feições sorridentes,
natal dos sapatinhos sob a cama,
dos olhos marotos do menino rico,
dos olhos parados do menino pobre.
Natal dos brinquedos:
a bola de futebol novinha e cheirando a couro,
a boneca de porcelana
que fecha os olhos e tem vestidos ricos,
o aeromodelo, elegante e leve,
quebrando os copos da cristaleira,
os bibelôs do quarto,
aterrissando nas panelas da cozinha:
“Menino, vá para o quintal!”
Natal dos embrulhos que guardam mistérios,
embrulhos de sonhos, de risos, de vida,
natal dos olhos curiosos.
A árvore verde
tem loucas vertigens e visões fantásticas:
veste de algodão
e debruns e estrelas
e lâmpadas coloridas,
que riem o risinho do pisca-pisca:
“apagou... acendeu... apagou... acendeu...”
Não! esse, na verdade, não é o Natal!
... E o presépio animado
do trenzinho correndo nos trilhos sinuosos:
“entrou no túnel comprido,
saiu da ponte, desceu a serra;
um operário malha a bigorna
ritmadamente;
os animais movem a cabeça.”
Não! Esse não é o Natal!
... E a mesa farta:
leitões assados com rodelas de limão
sobre o corpo tostadinho,
o peru recheado,
de peito aureolado em farofa cor de ouro,
os frangos,
as frutas, as passas,
as ameixas pretas,
as tâmaras morenas,
avelãs, nozes, castanhas...
bebidas, bebidas, bebidas
escorrendo, gotejando, geladas, loiras, espumantes.
Não! Esse é o natal-glutoneria!
Natal injusto é esse,
que divide castas
e separa classes
e alegra os ricos
e esmaga os pobres...
Maldito seja o natal que os homens inventaram
para que a mãe pobre o celebrasse chorando,
resistindo aos apelos:
- “Eu quero uma boneca!”
e às perguntas:
- “Papai Noel não vem?”
e às queixas:
- “Eu tenho fome! EU TENHO FOME!”
Maldito seja o natal-privilégio dos ricos,
que se mostram generosos
e distribuem migalhas aos pobres,
para comprar, com esse gesto, um terreno no céu:
um belo terreno de esquina,
com muitos metros quadrados,
em avenida principal.
Já disse e repito:
maldito seja esse falso natal,
esse mesquinho natal,
esse corrompido natal!
... E o natal-cumprimento:
telegramas urbanos,
parabéns, felicitações,
carta aérea, leve e curta,
bilhete escrito às pressas,
frase oca e vazia
bordada num cartão postal?
- Esse é o natal-hipocrisia
e está longe de ser o perfeito Natal!
Natal é muito mais:
é visão, esperança, certeza, humildade,
pastores, madrugada, estrebaria,
e José e Jesus e Maria,
e bondade
e alegria!
Cantarei o Natal!
“Dormem no campo os pastores,
os que tangem rebanhos sonhando.
Dormi, pastores, que a noite é um lírio
perfumado e eterno, branco e silencioso,
dormi como justos,
como crianças travessas,
um sono leve e escuro, macio e indevassável,
deixai que a terra úmida
aconchegue vossos corpos.
Despertareis em sonhos,
despertos sonhareis a visão almejada.
Abrem-se os céus como sulcos oceânicos
e embriagadora música emoldura a paisagem;
despertam figuras,
são anjos de largas e leves e rosadas asas,
brancas e celestes asas de pássaros gigantescos.
Despertai, homens do povo!
Humildes pastores das campinas verdes, despertai!
Anjos inquietos, suaves e claros
cantam em coro
o que ouvidos humanos jamais ouvirão...
escutai,pastores!
e guardai o cântico!
Guardai-o, para que se não dilua,
guardai-o, para que ainda o ouçamos
e dele falemos pelos séculos dos séculos. Amém.
Glória a Deus nas alturas!
Glória
a Deus nas alturas!
Repitam os campos e os astros e as sombras
e a noite, nas trevas que se movem vagarosas,
e a terra, quente, laboriosa e humana:
Glória a Deus nas alturas!
E as muitas águas,
e as pedras escuras, lascadas, fendidas,
suspensas no abismo como gesto atrevido,
e as folhas verdes bailando e sorrindo
como dedos de criança
e o capim cheiroso que as ovelhas comem
e as sinuosas vertentes transparentes e ágeis,
repeti o coro que os anjos ensinam:
Glória a Deus nas alturas
e Paz na terra aos homens de boa vontade!
Paz na terra!
Apesar das bombas e dos acordos diplomáticos,
apesar do nevoeiro denso
que esconde navios compridos, cinzentos e armados,
apesar do ronco dos aviões a jato,
dos estampidos supersônicos,
dos campos de concentração
onde os velhos mordiscam a morte
e os moços já não existem,
apesar das bandeiras,
das muitas bandeiras nervosas e bailarinas,
das inquietas bandeiras de asas mutiladas,
apesar da vingança e da conquista,
dos aleijados, dos órfãos, das viúvas,
apesar dos cadáveres sem túmulo,
expostos e pisados,
apesar da insânia,
das fronteiras,
do ódio velado, do profundo ódio
dos que foram derrubados mas não se perturbam,
apesar das experiências atômicas,
PAZ na Terra!
Paz na terra aos homens de boa vontade!
Eis o Natal, criaturas,
vinde bebê-lo sem o auxílio de vasilhas e potes de barro
dos muitos países,
vinde bebê-lo com as mãos em concha,
como quem se salva!
Vem de longe os magos:
são silhuetas
que os raios da estrela,
que os fios dourados da Estrela do Oriente
puxam, fazem andar, fazem parar, ensinam...
Vem de longe os magos,
para a fonte da água...
...Ouço vozes longínquas,
vozes ciclópicas abafadas pela distancia,
mas nítidas, definidas, exatas,
são vozes proféticas anunciando o tempo:
Isaías, Jeremias, Davi...
essas vozes completam o Natal,
definem e traduzem o Natal perfeito,
ouço vozes que cantam num coro harmonioso,
não há dissonâncias, nenhuma sequer.
O menino dorme
embalado pela estrela.
José medita,
Maria sorri...
sorri pelos olhos, pela boca, pelo corpo,
acariciada por essa alegria repousante
que é ser mãe.
Os magos estão curvados,
numa atitude obediente;
chegaram de muito longe,
para viver o Natal!
Os pastores cantam, os pássaros deslizam,
não há nada morto,
tudo é vida abundante,
eis o Natal!
Cantarei o Natal!
Glória a Deus nas alturas e paz na terra aos homens!
Ecoe meu cântico pelas cercanias indevassáveis,
inunde os templos como VENDAVAL impetuoso,
aqueça choupanas de famílias pobres,
alimente pobres,
acenda nos olhos do menino triste
o suave brilho da esperança presente,
alimente pobres com o pão macio,
branco e generoso, perfumado e quente.
Sacuda cidades o meu puro cântico
e destrua planos de vingança e ódio.
Proclame o saltério,
respondam as cordas, confirmem os arcos,
com maviosas vozes, doces, sussurrantes,
gritem as trombetas,
chorem as mulheres,
repitam os homens,
cantem as crianças...
O Natal é isto:
um misto de luzes e vidas, um misto
de perdão e calma...
mas calma profunda que nos satisfaz.
O Natal de Cristo
é o cântico eterno da perfeita Paz...
da Paz verdadeira, da paz-humildade,
dessa Paz sincera proclamada aos homens
de boa vontade:
PAZ NA TERRA AOS HOMENS
DE BOA VONTADE!
in 25 Anos de Gióia Júnior (1976 – Editora Betânia)
domingo, dezembro 12, 2010
UM POUCO DE POESIA À SOMBRA DO GÓLGOTA
.
Jefferson Magno Costa
O nascimento, o ministério, os ensinamentos, a morte e a ressurreição de Jesus Cristo constituem o alicerce do cristianismo. Cristo não foi um líder a mais a fundar uma religião, mas o único que, com o seu sangue derramado na cruz do Calvário, abriu para a humanidade o único caminho que conduz ao Céu.
No decorrer de quase dois mil anos, o cristianismo tem inspirado inumeráveis obras literárias. Por não querer cometer o pecado da prolixidade, reuni aqui tão-somente quatro poemas sobre o significado da morte de Jesus.
Dois deles foram escritos por poetas com quem eu tive o privilégio de conviver (Joanyr de Oliveira e Gióia Junior), servos de Deus que já partiram para encontrar-se com o Senhor Jesus, que lhes havia inspirado os mais belos poemas. Foram convocados para participar do encontro de poetas que já tem data marcada para acontecer no Céu, sob a liderança do sublime e inspiradíssimo salmista Davi. Esse é o encontro que eu jamais quero perder.
Entre esses poemas, inclui um soneto que escrevi em 1986 (naquela época, com vinte e poucos anos, eu era ingênuo o suficiente para cometer este e outros atentados contra a poesia).
SENHOR, EU VEJO
Joanyr de Oliveira
Com alguns pregos
trêmulos e um madeiro
pesado de angústias
e remorsos futuros
feriram-te, Cristo.
Hoje, Senhor, eu vejo.
Todo o peso do inferno
e a humana culpa
sobre ti desabaram
na extrema hora
da amarga colheita.
(Mas de plena vitória
sobre os braços da morte.)
Hoje, Senhor, eu vejo.
E eu lá estava, Jesus,
nessa carga de fel
e de agudo silêncio.
Teus olhos em sangue
sobre mim pousaram.
As gotas da fronte
apagaram abismos
de minhas trevas.
Hoje, Senhor eu vejo.
Vera vida brotou
de tua morte, Cristo.
E as colunas da noite
mergulhadas em pânico
gotejaram seu medo.
Mesmo os céus rasgaram
as cortinas do azul.
Em teu corpo moído
as máguas e as dores
deste mundo insano,
deste mundo em pântanos,
deste mundo infame.
Hoje, Senhor, eu vejo.
RECONQUISTA UNIVERSAL NO GÓLGOTA
Jefferson Magno Costa
Prego e carne,
têmpora e espinho,
lábios, sede
e sangue
soerguidos em cruz:
por entre pedras,
trapos de véu,
tremores
e túmulos iluminados,
rasgam um caminho,
vertical e límpido.
Equilibram, pesam
e compram
horizontes reencontrados.
A GRANDEZA DO AMOR DIVINO
José de Abreu Albano
Amar é desejar o sofrimento,
E contentar-se só de ter sofrido,
Sem um suspiro vão, sem um gemido,
No mal mais doloroso e mais cruento.
É viver desta vida tão isento
E neste mundo enfim tão esquecido,
É por o seu cuidar num só sentido,
E todo o seu sentir num só tormento.
É viver qual humilde carpinteiro,
De rudes pescadores rodeado,
Caminhando ao suplício derradeiro.
É viver sem carinho nem agrado,
E ser enfim vendido por dinheiro,
E entre ladrões, morrer crucificado.
ENCONTRO
Gióia Júnior
No espaço
sem luz
um traço
seduz.
Reduz
cansaço,
conduz
meus passos.
E avisto
o espaço
em luz.
– É Cristo
nos braços
da cruz!
Visite o blog do Pastor Jefferson: http://jeffersonmagnocosta.blogspot.com/
terça-feira, setembro 07, 2010
CARTA A UM POETA NO CÉU
*
Em 1996, a comunidade evangélica brasileira perdeu o grande poeta, radialista, deputado federal (por dois mandatos) e pastor batista, Gióia Júnior. Estive presente no seu culto fúnebre, e três dias após o seu sepultamento, escrevi esta carta que foi publicada em algumas revistas e jornais evangélicos:
"Caro amigo Gióia Júnior:
Agora que você não está mais entre nós, mas no céu, na região reservada ao descanso dos justos; agora que você usufrui da companhia de todos os grandes poetas de Deus,e com eles espera o grande dia da ressurreição final, só me resta escrever, apressadamente, algumas palavras em homenagem póstuma ao poeta que você foi. Apressadamente, sim, pois sei que em breve também raiará para mim a aurora do Dia Eterno. Aliás, fugaz e velozmente a vida passa para todos nós. Os que acham que terão muito tempo para chorar os seus mortos, brevemente serão chorados também. Muitos partem com os olhos ainda umedecidos das lágrimas que derramavam por alguém que havia partido pouco antes deles.
Nós já vamos pele vale um a um, entoaram aqueles dez cantores reunidos em torno do seu caixão, e sei que você, Gióia, com a imensa sensibilidade de que era dotado, muito se emocionaria se os tivesse ouvido, como eu os ouvi e me emocionei. Mas os seus ouvidos, agora para sempre surdos diante da dimensão de todos os sons terrestres, não mais puderam ouvi-los; nem o seu coração, para sempre paralisado diante de todas as emoções humanas, não mais estremeceu, emocionado.
Você passou, eu passarei, todos nós passaremos, mas a sua poesia ficará. Enquanto o coração de um pai ou de uma mãe bater apreensivo, tarde da noite, diante da demora de um filho ou de uma filha que ainda não voltou para casa, sempre haverá a esperança de que, a qualquer momento, a maçaneta da porta iniciará sua festiva canção do retorno. E todos os pais concordam e continuarão repetindo que:
"Caro amigo Gióia Júnior:
Agora que você não está mais entre nós, mas no céu, na região reservada ao descanso dos justos; agora que você usufrui da companhia de todos os grandes poetas de Deus,e com eles espera o grande dia da ressurreição final, só me resta escrever, apressadamente, algumas palavras em homenagem póstuma ao poeta que você foi. Apressadamente, sim, pois sei que em breve também raiará para mim a aurora do Dia Eterno. Aliás, fugaz e velozmente a vida passa para todos nós. Os que acham que terão muito tempo para chorar os seus mortos, brevemente serão chorados também. Muitos partem com os olhos ainda umedecidos das lágrimas que derramavam por alguém que havia partido pouco antes deles.
Nós já vamos pele vale um a um, entoaram aqueles dez cantores reunidos em torno do seu caixão, e sei que você, Gióia, com a imensa sensibilidade de que era dotado, muito se emocionaria se os tivesse ouvido, como eu os ouvi e me emocionei. Mas os seus ouvidos, agora para sempre surdos diante da dimensão de todos os sons terrestres, não mais puderam ouvi-los; nem o seu coração, para sempre paralisado diante de todas as emoções humanas, não mais estremeceu, emocionado.
Você passou, eu passarei, todos nós passaremos, mas a sua poesia ficará. Enquanto o coração de um pai ou de uma mãe bater apreensivo, tarde da noite, diante da demora de um filho ou de uma filha que ainda não voltou para casa, sempre haverá a esperança de que, a qualquer momento, a maçaneta da porta iniciará sua festiva canção do retorno. E todos os pais concordam e continuarão repetindo que:
Não há mais bela música
que o ruído da maçaneta da porta,
quando o meu filho volta para casa.
Volta da rua, da vasta noite,
da madrugada de estranhas vozes,
e o ruído da maçaneta,
e o gemer do trinco,
o bater da porta que novamente se fecha,
o tilintar inconfundível do molho de chaves
são um doce acalanto,
uma suave cantiga de ninar.
Só assim fecho os olhos;
Posso, afinal, dormir e descansar.
(Oração da maçaneta, trecho do poema)
Enquanto houver mulheres preparando a comida para o marido e os filhos, e envelhecendo na frente de fogões, sua poesia será lembrada. E quantas mães já não leram esse trecho do seu poema, achando que você o escreveu inspirado nelas?
Na frente do fogão, enquanto os filhos crescem,
vão sendo modelados pela vida e pelo tempo,
chegam e a beijam na testa,
e ela na frente do fogão,
chegam e dizem um “olá” distante,
e ela na frente do fogão,
chegam e não dizem nada,
e ela na frente do fogão,
porque a chama abraça o fundo da panela
para que o jantar fique pronto,
para que eles matem a fome
e cresçam mais e se afastem dela cada vez mais.
(Mulher na frente do fogão, trecho do poema)
Sua poesia só será esquecida quando Jesus deixar de ser a alegria dos homens. Mas nós sabemos que:
Nesta hora de incerteza,
de cansaço e de agonia;
nesta hora em que, de novo,
a guerra se prenuncia;
neste momento em que o povo
não tem rumo nem tem guia,
ó Jesus, agora e sempre,
Tu és a nossa alegria!
(Jesus, alegria dos homens, trecho do poema)
Quando todos os meninos pobres do mundo receberem o pão que os homens lhe roubaram, sua poesia será esquecida. Porém, no exato momento em que esta carta está sendo escrita, há um menino pobre (aliás, há milhões de meninos pobres) necessitando ouvir suas palavras de solidariedade e incentivo, Gióia:
Menino pobre do meu bairro, grita
para que escutem tua voz tremente,
amargurada, enfraquecida e aflita.
Pelos irmãos que dantes não gritaram,
clama nas ruas angustiosamente:
exige o pão que os homens te roubaram!
(Menino pobre, trecho do soneto)
O poeta grego Homero cantou na Ilíada a guerra entre gregos e troianos e a interferência dos falidos e extintos deuses do Olimpo. O italiano Dante Alighiere desceu ao Inferno nas asas da imaginação e, de lá, essas suas asas o levaram ao Paraíso; mas tudo não passou de uma Divina Comédia. O poeta português Luis Vaz de Camões cantou em Os Lusíadas as grandes rotas de navegação que interferiram no tracejamento do mapa do mundo moderno, e o poeta inglês John Milton, após mergulhar na cegueira absoluta, ditou para suas filhas o poema O Paraíso Perdido, e nele viu a tremenda rebelião de Satanás. E você, Gióia, preferiu cantar em seus poemas a vida e a situação das pessoas humildes, dos pobres, dos injustiçados que se amontoam na condição de desbrigados, famintos, doentes e esquecidos, abandonados ao pé da pirâmide social.
Agora que você está aí tão perto do coração de Deus; agora que você tornou-se um habitante da santa e felicíssima Jerusalém celestial, onde a juventude nunca envelhece, o amor nuca diminui, o contentamento não se interrompe nem a vida jamais se acaba; agora sabemos, Gióia, que você não mais contempla o rosto ensangüentado de Cristo, aquele Rosto sofredor, de olhar parado e enxuto, que você descreveu com tanta sensibilidade no seu poema Ó Rosto ensanguentado! (Leia todos esses maravilhosos poemas e muitos outros no livro Orações do Cotidiano, publicado pela Mundo Cristão).
E a própria morte, que para muitos é motivo de apreensão e medo, você não a temia. E até nos ensinou a não temê-la! Sim, porque para nós, que conhecemos a Cristo, morrer é finalmente alcançar a altíssima paz; é ser recebido por um cortejo de anjos; é ser saudado pelos clarins celestiais; é receber vestes resplandecentes, harpas e coroas de ouro; é nos tornarmos mais altos e mais belos que as estrelas, e passarmos a encher os espaços infinitos com melodias de gratidão e adoração a Deus.
E, para que todos nós aprendamos a não temer a morte, transcreverei aqui, caro poeta, este seu poema sobre a morte – última porta que se abrirá para nós, antes de embarcarmos e subirmos velozmente conduzidos pelo elevador de fogo de Deus, que nos transportará para a cobertura do Céu, com vistas para o infinito (devo esta belíssima metáfora ao meu amigo e irmão em Cristo Nelson Ned, a quem tive a honra de biografar):
Agora que você está aí tão perto do coração de Deus; agora que você tornou-se um habitante da santa e felicíssima Jerusalém celestial, onde a juventude nunca envelhece, o amor nuca diminui, o contentamento não se interrompe nem a vida jamais se acaba; agora sabemos, Gióia, que você não mais contempla o rosto ensangüentado de Cristo, aquele Rosto sofredor, de olhar parado e enxuto, que você descreveu com tanta sensibilidade no seu poema Ó Rosto ensanguentado! (Leia todos esses maravilhosos poemas e muitos outros no livro Orações do Cotidiano, publicado pela Mundo Cristão).
E a própria morte, que para muitos é motivo de apreensão e medo, você não a temia. E até nos ensinou a não temê-la! Sim, porque para nós, que conhecemos a Cristo, morrer é finalmente alcançar a altíssima paz; é ser recebido por um cortejo de anjos; é ser saudado pelos clarins celestiais; é receber vestes resplandecentes, harpas e coroas de ouro; é nos tornarmos mais altos e mais belos que as estrelas, e passarmos a encher os espaços infinitos com melodias de gratidão e adoração a Deus.
E, para que todos nós aprendamos a não temer a morte, transcreverei aqui, caro poeta, este seu poema sobre a morte – última porta que se abrirá para nós, antes de embarcarmos e subirmos velozmente conduzidos pelo elevador de fogo de Deus, que nos transportará para a cobertura do Céu, com vistas para o infinito (devo esta belíssima metáfora ao meu amigo e irmão em Cristo Nelson Ned, a quem tive a honra de biografar):
Vem, doce morte, eu sei que não és o mistério
do sem fim, o pavor do escuro cemitério,
não és o vulto mau, a sombra horrenda e esguia
do cutelo fatal e da mão muito fria,
cujo afago cruel, implacável, glacial,
arrebata mães e rouba crianças...
E como és diferente!
És um sussurro manso,
um cântico de paz, um hino de descanso.
És o dia esperado em que os filhos da luz
poderão ver, afinal, o rosto de Jesus.
Leva-me pela mão, ó delicada irmã,
ao jardim multicor da Nova Canaã.
Irei como um menino, alegre, num transporte...
Minh’alma te deseja e diz:
“Vem, doce morte!”.
Até breve, poeta!
Jefferson Magno Costa
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domingo, julho 25, 2010
Um poema de Gióia Júnior - Vem, Doce Morte
*
Vem, Doce MorteVem, doce morte, eu sei que não és o mistério
do sem fim, o pavor do escuro cemitério,
não és o vulto mau, a sombra horrenda e esguia
do cutelo fatal e da mão muito fria
cujo afago cruel, implacável, glacial,
causa toda a aflição do momento final...
Pintam-te assim: voraz, a bailar pela estepe
da existência, andrajosa e vestida de crepe,
megera desumana afogada em vinganças,
arrebatando mães e roubando crianças...
E como és diferente!
És um sussurro manso,
um cântico de paz, um hino de descanso.
Vens brilhando, vens clara e majestosa, toda
adornada de luz como a manhã da Boda.
És o encontro, o momento eterno e majestoso
em que a noiva, feliz se aproxima do esposo...
És o dia esperado em que, os filhos da Luz
podem ver, afinal, o rosto de Jesus,
o dia em que Jesus conduz os filhos seus
para a Vida Eternal na Cidade de Deus,
onde não há mais pranto, onde não há mais dor,
onde existe somente a glória do Senhor!
És um caminho bom – o melhor dos caminhos –
macio, leve, azul, sem pedras ou espinhos.
Leva-me pela mão, ó delicada irmã,
ao Jardim multicor da Nova Canaã.
Irei como um menino, alegre, num transporte...
minh’alma te deseja e diz:
“Vem, doce morte!”
Do livro 25 Anos de Gióia Júnior (Editora Betânia)
sexta-feira, agosto 07, 2009
Um poema de Gióia Júnior, especial para o Dia dos Pais
*

Boa leitura!
UMA VIDA EM MINHA VIDA
Perdi-o.
Não o tenho.
Telefonarei para sua casa, e da distância, voz um tanto
abafada, palavras de ternura de rosa (desta mesma rosa
amarela que está sobre a mesa em que escrevo)
ele não falará comigo.
Irei buscá-lo em meu pequenino carro barulhento, para
as longas visitas habituais, e ele não irá comigo.
Não estará mais lendo em sua biblioteca (a imensa
colméia de onde vinham seus sermões). Não virá mais orar
à cabeceira de minha cama, quando eu estiver doente.
Seu púlpito está vazio.
Tristemente vazio.
Onde os largos gestos firmes?
As mãos para traz
e o corpo todo sentindo o sermão na ponta dos pés?
Onde o timbre da voz,
doce e penetrante,
metálico às vezes,
outras vezes aveludado?
Nos aniversários, não lerá para nós o salmo predileto.
No Natal, enfeitará de saudade nossas possíveis alegrias.
O terno preto dos domingos, levou-o um pobre.
O chapéu inconfundível,
real como uma vida,
dorme sobre o cabide.
Não há mais sol ou chuva
que desçam sobre sua cabeça pintada de neve.
“Eu irei para ele, porém ele não virá para mim.”
Não o tenho. Perdi-o.
Há coisa mais triste?
II
Eu era pequenino, de calças curtas.
Igreja Paulistana há alguns decênios. Dona Ida, Dona
Paula, Dona Noêmia, Seu João Donatz, Arnaldo de Matos,
Furtado de Mendonça, Dona Dagmar, Dona Alcina, Diácono Iraci.
Na escola dominical eu teria de dizer uma poesia.
Uma das primeiras poesias que disse em minha vida.
Ela falava de um pai que ia ficando velho,
cujos cabelos embranqueciam.
Falava do filho que não queria perder o pai.
Naquele tempo meu pai era moço e forte.
Olhos de brilho penetrante. Cabelos negros.
Não consegui declamar a poesia até o fim.
Chorei.
Seu Mendonça chorou, me carregou no colo. Papai chorou.
A Igreja chorou.
Isto foi há muitos, muitos anos.
Que gostosa aquela tristeza!
Eu era menino, papai era moço –
Havia uma longa vida pela frente.
III
Levou-me pela primeira vez ao Colégio. Eu e Paulo.
Ao Colégio Batista da mesma Rua Homem de Melo, nas Perdizes.
O Diretor era Mister Morgan.
As professoras eram Dona Ludmilla, Dona Leleza.
Dona Leleza que tocava piano enquanto a gente
do Jardim da Infância dormia.
Paulo não quis ficar. Fugiu. Fui atrás dele.
Meu pai ria, ria, ria.
No Jardim, eu repetia para os coleguinhas
toda aquela belicosidade de meu pai.
Um dia agarrei um santinho do peito de um menino,
joguei-o ao chão e provoquei:
- “Não é santo. Piso nele e ele não faz nada!”
- “Quieto menino, respeite a religião dos outros.”
IV
Foi meu Professor de Português.
Preparou-me para o admissão.
Graças ao seu grosso lápis vermelho e azul,
tirei as melhores notas e aprendi a conjugar os verbos,
especialmente no imperativo negativo e positivo.
Fomos para Campo Grande.
Ele foi meu professor nos 4 anos de Ginásio.
Dava notas mais rigorosas para mim.
Eu caprichava nas composições,
mas os colegas tinham notas mais altas que as minhas.
Um dia fiz a composição de outro colega.
Tirei nota inferior.
Ele soube depois e riu muito.
- Tenho que puxar pelo meu filho.
Quero que ele saiba mais que os outros.
V
Leu meus primeiros poemas:
- Não está bom não, filho, está um tanto forçado.
Poesia é algo muito natural. Assim como a respiração, entende?
Nada o satisfazia.
Queria que o filho escrevesse melhor.
Um dia escrevi um poema para mamãe,
que estava doente e longe da gente.
Levei ao escritório para que o lesse.
Leu-o e não disse palavra.
Tirou os óculos, enxugou uma lágrima.
Depois me abraçou e chorou. Chorou muito.
Chorava e ria como o faria muitas vezes vida à fora –
Foi o maior elogio que fez a um poema de seu filho!
Prefaciou gulosamente,
de olhos arregalados como uma criança que come um doce,
os dois primeiros livros que escrevi.
Era o primeiro a ler qualquer poema que eu escrevesse.
O meu crítico, o meu orientador, o meu amigo.
VI
Aos dez anos me batizou,
ali no batistério da Primeira Igreja Batista.
Era uma noite fria.
Salústio Areias também foi batizado no mesmo dia.
Eu tinha tido sarampo.
Disseram que era perigoso uma recaída.
Ele não acreditou nisso.
Fez questão que o batismo fosse naquele dia.
- “Meu filho (para os outros dizia, meu irmão)
renovas a tua profissão de fé,
consciente e livre
feita perante a Igreja e perante Deus”
- “Renovo!” - respondi, rouco e tímido.
Eu estava amedrontado.
Levantou a mão direita. Colocou a esquerda sobre o
meu ombro. Baixou a cabeça e exclamou em alta voz:
- “Eu te batizo em nome do Pai, e do Filho
e do Espírito Santo. Amém!”
E, me olhando por cima dos óculos,
falou baixinho aos meus ouvidos:
“não tenha medo”.
E por suas mãos firmes e enérgicas
belas e claras,
fui mergulhado nas águas batismais.
VII
Fez o meu casamento na Igreja do Brás.
Chamou Dinorah num canto e disse brincando:
- Se algum dia ele judiar de você, venha à minha
Casa e se queixe. Puxo as orelhas dele.
Minha nora é minha filha.
- Numa fria e cinzenta manhã de junho,
ficou torcendo comigo para que o meu primeiro filho
fosse um homem:
- “Vai ter o meu nome, será o neto!
Quando crescer vai herdar de você
o grande relógio velho do meu escritório, que foi de
meu avô e de meu pai.”
Aquele mesmo relógio para o qual escrevi uma elegia.
- É menino!
Chorou comigo. Chorou e riu como tantas vezes o faria vida a fora.
Fomos juntos, como dois colegiais, registrar o meu primeiro filho.
Depois veio Rosely e a alegria foi a mesma:
agora era a netinha.
Chorou comigo. Riu comigo.
Fomos juntos, conversando como dois companheiros,
registrar no Cartório do Brás
a menina que trazia tanta alegria ao nosso lar.
No Hospital das Clínicas,
a maior preocupação do Erasmo era a saúde de meu pai.
- Não quero que ele venha aqui. Não quero que ele se impressione.
Como está papai?
- Papai está bem!
Paulo não chegava de viagem sem que viesse tomar a
bênção de seu velho pai:
- Ando meio preocupado, papai está um tanto abatido...
Erasmo foi chamado à Glória de Deus.
Paulo foi fazer companhia a Erasmo.
Vovó foi também cantar louvores no céu!
Papai está bem!
Como está bem? Tem chorado muito!
Chorado sem que ninguém o veja.
Escondidinho no escritório.
De noite, quando os outros dormem.
Saudades que seu coração quase não suporta.
Muitas vezes esteve à beira da morte,
e as orações dos crentes de todo o Brasil o fizeram sarar.
- Quando Deus tiver de me levar,
a Igreja nem saberá que estou doente,
para que não tenha tempo de lutar com Deus,
pedindo a minha cura.
VIII
Quantas visitas fez?
Quantos sermões pregou?
Em quantos Estados semeou?
Quantas almas levou para o aprisco do Mestre?
A quantos confortou, esclareceu,
encaminhou, dirigiu, ensinou, orientou, guiou, salvou?
Não sei. De uma coisa sei, “que eu era cego e agora vejo”!
Foi o Billy Graham caboclo,
o Moody de Piracicaba.
Sem recursos, sem equipes, sem meios,
sacudiu a Pátria com a sua palavra simples,
direta, humana, enérgica,
convincente, comovente,
plena do poder do Espírito Santo.
IX
Perdi-o.
Não o tenho.
Desejarei falar com ele,
como quem morre de sede,
e ele não ouvirá a minha súplica.
Trocarei bens e glória
e prazeres e planos
por uma migalha de seu sorriso,
por uma gota do brilho dos seus olhos.
Não sorrirá. Não me verá.
Dele resta o grande vazio que ninguém preenche.
Um nó em minha garganta,
as mãos trêmulas, os olhos vermelhos.
Enquanto morria,
seus colegas pastores estavam à sua cabeceira.
Ele respirava compassadamente.
Não via, não falava, não se movia.
Apenas respirava.
O seu sopro parecia o bater nervoso
das asas de um pássaro ferido.
Eu, Guta, Elza Helena, Maria Helena, Lídia Helena e
mamãe chorávamos um choro manso,
sem gritos, sem revolta, sem blasfêmia.
A respiração foi se ralentando.
Foi murchando lenta e suavemente. Parou.
Pastor Erodice recitou e todos nós repetimos:
- “O Senhor nos deu, o Senhor nos tomou.
Bendito seja o nome do Senhor!”
X
D. Gláucia Petcov olhou para mim e repetiu baixinho
um trecho do meu poema VEM DOCE MORTE:
“... és um sussurro manso...”
pela certeza de que
“os que crêem NELE ainda que estejam mortos,
viverão.”
Felizes, porque
“Uma mui feliz cidade existe
além das brumas e da cerração.”
A Jerusalém excelsa onde não há mais pranto nem dor.
A Cidade Santa.
Quando deixávamos o Araçá, Dinorah sentiu as primeiras dores.
Menos de duas horas depois,
Deus, no seu infinito amor,
mandava o meu terceiro filho – o Rubinho.
O netinho que o vovô não conheceu.
O netinho que alegrou o coração da vovó
e do papai e da mamãe e dos tios,
no dia em que nosso tesouro ficava no Araçá.
http://poesiaevanglica.blogspot.com
XI
Registrei meu filho no Cartório do Brás.
Guta foi comigo.
Papai não assinou como testemunha.
Papai não está mais com a gente.
Perdi-o.
Não o tenho mais!
Não o terei mais! Nunca mais!
Nos aniversários, não lerá para nós o salmo predileto.
No Natal, enfeitará de saudade nossas possíveis alegrias.
O terno preto dos domingos, levou-o um pobre.
O chapéu desabado, cinzento, fosco,
murchou como estranha flor.
Os cãezinhos não farão mais festas a seus pés.
Os canários, aos quais levava alpiste todas as manhãs,
não cantarão mais para seus olhos de menino feliz.
Não dará mais o braço à minha mãe,
na caminhada terna e carinhosa dos domingos.
Os vizinhos não dirão mais:
“Vão eles de braços dados. Parecem adolescentes.
Dois namorados, isso é o que parecem.”
(Minha mãe,
minha linda mãe, filha de um corajoso espanhol de Málaga,
é uma rocha em frente ao mar.
Batida pelas ondas e pelos cortantes ventos da costa.
Em três anos perdeu a mãe, o marido e dois filhos.
Mas é quem nos consola,
quem nos conforta,
quem nos encoraja.)
Não morreu, no entanto.
Está no trabalho que fez,
nos livros que escreveu,
nos sermões que pregou, nas almas que levou a Cristo,
na Igreja que dirigiu.
E em mim.
No que penso, no que falo, no que escrevo, no que vivo.
Meu exemplo, meu estímulo, meus poemas, minha saudade.
Minha enorme saudade.
Minha vida.
Uma vida em minha vida!
Do livro '25 Anos de Gióia Júnior' (Editora Betânia).

Em homenagem ao Dia dos Pais, publicamos aqui o terno poema Uma Vida em Minha Vida, escrito pelo saudoso poeta Gióia Júnior em homenagem a seu pai, Pr. Raphael Gióia. É um poema longo e permeado por uma doce tristeza, mas belíssimo. Que ele possa nos fazer refletir – para aqueles que já não tem mais seu pai consigo, que esse texto possa evocar as melhores lembranças; e para os que os tem, vivos, que faça com que eles sejam valorizados ainda mais.
Boa leitura!
UMA VIDA EM MINHA VIDA
Perdi-o.
Não o tenho.
Telefonarei para sua casa, e da distância, voz um tanto
abafada, palavras de ternura de rosa (desta mesma rosa
amarela que está sobre a mesa em que escrevo)
ele não falará comigo.
Irei buscá-lo em meu pequenino carro barulhento, para
as longas visitas habituais, e ele não irá comigo.
Não estará mais lendo em sua biblioteca (a imensa
colméia de onde vinham seus sermões). Não virá mais orar
à cabeceira de minha cama, quando eu estiver doente.
Seu púlpito está vazio.
Tristemente vazio.
Onde os largos gestos firmes?
As mãos para traz
e o corpo todo sentindo o sermão na ponta dos pés?
Onde o timbre da voz,
doce e penetrante,
metálico às vezes,
outras vezes aveludado?
Nos aniversários, não lerá para nós o salmo predileto.
No Natal, enfeitará de saudade nossas possíveis alegrias.
O terno preto dos domingos, levou-o um pobre.
O chapéu inconfundível,
real como uma vida,
dorme sobre o cabide.
Não há mais sol ou chuva
que desçam sobre sua cabeça pintada de neve.
“Eu irei para ele, porém ele não virá para mim.”
Não o tenho. Perdi-o.
Há coisa mais triste?
II
Eu era pequenino, de calças curtas.
Igreja Paulistana há alguns decênios. Dona Ida, Dona
Paula, Dona Noêmia, Seu João Donatz, Arnaldo de Matos,
Furtado de Mendonça, Dona Dagmar, Dona Alcina, Diácono Iraci.
Na escola dominical eu teria de dizer uma poesia.
Uma das primeiras poesias que disse em minha vida.
Ela falava de um pai que ia ficando velho,
cujos cabelos embranqueciam.
Falava do filho que não queria perder o pai.
Naquele tempo meu pai era moço e forte.
Olhos de brilho penetrante. Cabelos negros.
Não consegui declamar a poesia até o fim.
Chorei.
Seu Mendonça chorou, me carregou no colo. Papai chorou.
A Igreja chorou.
Isto foi há muitos, muitos anos.
Que gostosa aquela tristeza!
Eu era menino, papai era moço –
Havia uma longa vida pela frente.
III
Levou-me pela primeira vez ao Colégio. Eu e Paulo.
Ao Colégio Batista da mesma Rua Homem de Melo, nas Perdizes.
O Diretor era Mister Morgan.
As professoras eram Dona Ludmilla, Dona Leleza.
Dona Leleza que tocava piano enquanto a gente
do Jardim da Infância dormia.
Paulo não quis ficar. Fugiu. Fui atrás dele.
Meu pai ria, ria, ria.
No Jardim, eu repetia para os coleguinhas
toda aquela belicosidade de meu pai.
Um dia agarrei um santinho do peito de um menino,
joguei-o ao chão e provoquei:
- “Não é santo. Piso nele e ele não faz nada!”
- “Quieto menino, respeite a religião dos outros.”
IV
Foi meu Professor de Português.
Preparou-me para o admissão.
Graças ao seu grosso lápis vermelho e azul,
tirei as melhores notas e aprendi a conjugar os verbos,
especialmente no imperativo negativo e positivo.
Fomos para Campo Grande.
Ele foi meu professor nos 4 anos de Ginásio.
Dava notas mais rigorosas para mim.
Eu caprichava nas composições,
mas os colegas tinham notas mais altas que as minhas.
Um dia fiz a composição de outro colega.
Tirei nota inferior.
Ele soube depois e riu muito.
- Tenho que puxar pelo meu filho.
Quero que ele saiba mais que os outros.
V
Leu meus primeiros poemas:
- Não está bom não, filho, está um tanto forçado.
Poesia é algo muito natural. Assim como a respiração, entende?
Nada o satisfazia.
Queria que o filho escrevesse melhor.
Um dia escrevi um poema para mamãe,
que estava doente e longe da gente.
Levei ao escritório para que o lesse.
Leu-o e não disse palavra.
Tirou os óculos, enxugou uma lágrima.
Depois me abraçou e chorou. Chorou muito.
Chorava e ria como o faria muitas vezes vida à fora –
Foi o maior elogio que fez a um poema de seu filho!
Prefaciou gulosamente,
de olhos arregalados como uma criança que come um doce,
os dois primeiros livros que escrevi.
Era o primeiro a ler qualquer poema que eu escrevesse.
O meu crítico, o meu orientador, o meu amigo.
VI
Aos dez anos me batizou,
ali no batistério da Primeira Igreja Batista.
Era uma noite fria.
Salústio Areias também foi batizado no mesmo dia.
Eu tinha tido sarampo.
Disseram que era perigoso uma recaída.
Ele não acreditou nisso.
Fez questão que o batismo fosse naquele dia.
- “Meu filho (para os outros dizia, meu irmão)
renovas a tua profissão de fé,
consciente e livre
feita perante a Igreja e perante Deus”
- “Renovo!” - respondi, rouco e tímido.
Eu estava amedrontado.
Levantou a mão direita. Colocou a esquerda sobre o
meu ombro. Baixou a cabeça e exclamou em alta voz:
- “Eu te batizo em nome do Pai, e do Filho
e do Espírito Santo. Amém!”
E, me olhando por cima dos óculos,
falou baixinho aos meus ouvidos:
“não tenha medo”.
E por suas mãos firmes e enérgicas
belas e claras,
fui mergulhado nas águas batismais.
VII
Fez o meu casamento na Igreja do Brás.
Chamou Dinorah num canto e disse brincando:
- Se algum dia ele judiar de você, venha à minha
Casa e se queixe. Puxo as orelhas dele.
Minha nora é minha filha.
- Numa fria e cinzenta manhã de junho,
ficou torcendo comigo para que o meu primeiro filho
fosse um homem:
- “Vai ter o meu nome, será o neto!
Quando crescer vai herdar de você
o grande relógio velho do meu escritório, que foi de
meu avô e de meu pai.”
Aquele mesmo relógio para o qual escrevi uma elegia.
- É menino!
Chorou comigo. Chorou e riu como tantas vezes o faria vida a fora.
Fomos juntos, como dois colegiais, registrar o meu primeiro filho.
Depois veio Rosely e a alegria foi a mesma:
agora era a netinha.
Chorou comigo. Riu comigo.
Fomos juntos, conversando como dois companheiros,
registrar no Cartório do Brás
a menina que trazia tanta alegria ao nosso lar.
No Hospital das Clínicas,
a maior preocupação do Erasmo era a saúde de meu pai.
- Não quero que ele venha aqui. Não quero que ele se impressione.
Como está papai?
- Papai está bem!
Paulo não chegava de viagem sem que viesse tomar a
bênção de seu velho pai:
- Ando meio preocupado, papai está um tanto abatido...
Erasmo foi chamado à Glória de Deus.
Paulo foi fazer companhia a Erasmo.
Vovó foi também cantar louvores no céu!
Papai está bem!
Como está bem? Tem chorado muito!
Chorado sem que ninguém o veja.
Escondidinho no escritório.
De noite, quando os outros dormem.
Saudades que seu coração quase não suporta.
Muitas vezes esteve à beira da morte,
e as orações dos crentes de todo o Brasil o fizeram sarar.
- Quando Deus tiver de me levar,
a Igreja nem saberá que estou doente,
para que não tenha tempo de lutar com Deus,
pedindo a minha cura.
VIII
Quantas visitas fez?
Quantos sermões pregou?
Em quantos Estados semeou?
Quantas almas levou para o aprisco do Mestre?
A quantos confortou, esclareceu,
encaminhou, dirigiu, ensinou, orientou, guiou, salvou?
Não sei. De uma coisa sei, “que eu era cego e agora vejo”!
Foi o Billy Graham caboclo,
o Moody de Piracicaba.
Sem recursos, sem equipes, sem meios,
sacudiu a Pátria com a sua palavra simples,
direta, humana, enérgica,
convincente, comovente,
plena do poder do Espírito Santo.
IX
Perdi-o.
Não o tenho.
Desejarei falar com ele,
como quem morre de sede,
e ele não ouvirá a minha súplica.
Trocarei bens e glória
e prazeres e planos
por uma migalha de seu sorriso,
por uma gota do brilho dos seus olhos.
Não sorrirá. Não me verá.
Dele resta o grande vazio que ninguém preenche.
Um nó em minha garganta,
as mãos trêmulas, os olhos vermelhos.
Enquanto morria,
seus colegas pastores estavam à sua cabeceira.
Ele respirava compassadamente.
Não via, não falava, não se movia.
Apenas respirava.
O seu sopro parecia o bater nervoso
das asas de um pássaro ferido.
Eu, Guta, Elza Helena, Maria Helena, Lídia Helena e
mamãe chorávamos um choro manso,
sem gritos, sem revolta, sem blasfêmia.
A respiração foi se ralentando.
Foi murchando lenta e suavemente. Parou.
Pastor Erodice recitou e todos nós repetimos:
- “O Senhor nos deu, o Senhor nos tomou.
Bendito seja o nome do Senhor!”
X
D. Gláucia Petcov olhou para mim e repetiu baixinho
um trecho do meu poema VEM DOCE MORTE:
“... és um sussurro manso...”
pela certeza de que
“os que crêem NELE ainda que estejam mortos,
viverão.”
Felizes, porque
“Uma mui feliz cidade existe
além das brumas e da cerração.”
A Jerusalém excelsa onde não há mais pranto nem dor.
A Cidade Santa.
Quando deixávamos o Araçá, Dinorah sentiu as primeiras dores.
Menos de duas horas depois,
Deus, no seu infinito amor,
mandava o meu terceiro filho – o Rubinho.
O netinho que o vovô não conheceu.
O netinho que alegrou o coração da vovó
e do papai e da mamãe e dos tios,
no dia em que nosso tesouro ficava no Araçá.
http://poesiaevanglica.blogspot.com
XI
Registrei meu filho no Cartório do Brás.
Guta foi comigo.
Papai não assinou como testemunha.
Papai não está mais com a gente.
Perdi-o.
Não o tenho mais!
Não o terei mais! Nunca mais!
Nos aniversários, não lerá para nós o salmo predileto.
No Natal, enfeitará de saudade nossas possíveis alegrias.
O terno preto dos domingos, levou-o um pobre.
O chapéu desabado, cinzento, fosco,
murchou como estranha flor.
Os cãezinhos não farão mais festas a seus pés.
Os canários, aos quais levava alpiste todas as manhãs,
não cantarão mais para seus olhos de menino feliz.
Não dará mais o braço à minha mãe,
na caminhada terna e carinhosa dos domingos.
Os vizinhos não dirão mais:
“Vão eles de braços dados. Parecem adolescentes.
Dois namorados, isso é o que parecem.”
(Minha mãe,
minha linda mãe, filha de um corajoso espanhol de Málaga,
é uma rocha em frente ao mar.
Batida pelas ondas e pelos cortantes ventos da costa.
Em três anos perdeu a mãe, o marido e dois filhos.
Mas é quem nos consola,
quem nos conforta,
quem nos encoraja.)
Não morreu, no entanto.
Está no trabalho que fez,
nos livros que escreveu,
nos sermões que pregou, nas almas que levou a Cristo,
na Igreja que dirigiu.
E em mim.
No que penso, no que falo, no que escrevo, no que vivo.
Meu exemplo, meu estímulo, meus poemas, minha saudade.
Minha enorme saudade.
Minha vida.
Uma vida em minha vida!
Do livro '25 Anos de Gióia Júnior' (Editora Betânia).
sexta-feira, junho 19, 2009
Três poemas de Gióia Júnior
SALMO I
O Senhor está no barracão da favela
e a fome é menos rude
e o frio é mais ameno;
O Senhor está nos bondes barulhentos
e o cansaço é mais leve
e o perigo é menor;
O Senhor está ao lado dos guardas da noite
e o medo não existe
e não há solidão;
O Senhor está no cais onde os homens trabalham
e os fardos são mais leves
e as horas menos lentas;
O Senhor está nos asilos onde os jovens anseiam
e a Sua presença aquece
como um retorno de mãe;
O Senhor está nos hospitais de indigentes
e a dor desaparece
e o sono logo vem...
Bendito seja o Senhor!
______________Bendito seja!
_________________________Amém!
INTERLÚDIO I
Ah! noite aquela em que Ele foi traído!
e foi abandonado e foi moído
por minhas transgressões! Ah! noite aquela,
dura e profunda, silenciosa e bela!
de uma beleza trágica e voraz!
De ti, oh, noite, vem a nossa paz...
De tua escuridão irrompe a luz
nasce o perdão, desperta a fé, emerge a cruz.
INTERLÚDIO II
Onde estão os muros da Cidade Eterna?
onde estão os salvos? e os queridos meus?
onde estão as luzes da manhã primeira?
onde a estrela santa do menino-Deus?
onde estão as vozes do coral celeste
anjos proclamando que chegou a luz?
onde brilha agora o sangue do Cordeiro
no momento exato em que morreu na cruz?
Meu Divino Mestre, dá-me a Tua mão
para que eu os ache no meu coração!
e embora haja trevas e embora anoiteça
que eu nunca os esqueça... que eu nunca os esqueça.
Do livro '25 Anos de Gióia Júnior', Editora Betânia, 1976
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